------- a coisa-em-mim -------

desaforismos. fábulas sem moral. egotrips. brainstorms.

segunda-feira, abril 23, 2007

oráculo.

Era ele lá no fundo da taberna, debruçado sobre uma dessas mesas pesadas de madeira maciça que de tanto, pareciam enraizadas ao chão. Guardanapos amassados jaziam sobre a mesa, e neles uns rabiscos feitos à caneta preta, palavras como "orquestra", "pachorra", "doidivanas" e "condoído" compunham o conteúdo do que ele dizia suas vaticinações. Frenético a rabiscar feito um médium em contato com forças ocultas; e caso realmente fosse, tenho certeza de que eram aquelas mesmas culpadas pela renúncia de Jânio Quadros. Havia eu acabado de chegar da aula de balé quando presenciei toda a cena, no caminho até ali pensava na pergunta-joyceana-que-perguntava pela palavra que todos os homens conhecem. Qual era? Também me sentei em uma mesa de canto, fiquei ali cuidando dos meus pés que sangravam nas pontas, as unhas roxas de tanto battement glissé. Munida de gaze e mercuriocromo de fórmula antiga, aquela que fazia arder, me apercebia um tanto quanto masoquista, não soprava nunca, pra manter aquele ardor tão gos-to-so. Ele permanecia ali, concentrado, esvaziando a taça de vinho, e numa relação inversamente proporcional, enchia os guardanapos daquelas profecias todas. Percebeu enfim que dele eu não tirava os olhos, e lentamente se levantou. Com a boca roxa e seca e repuxando de tanino, veio andando em minha direção. Tomou-me o mercuriocromo das mãos e segurando com força o meu rosto, eu horrorizada, escreveu-me à testa: "para peixe que engole mar: demi-plié."

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