------- a coisa-em-mim -------

desaforismos. fábulas sem moral. egotrips. brainstorms.

domingo, abril 29, 2007

individuações.

Tereza era. Com uma velha máquina fotográfica, andava por todas as ruas, ruelas e alamedas em busca de imagens de sapatos pendurados pelos cadarços nos fios elétricos da cidade.
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Elza seria. Fazia apostas com a repetição e com o acaso: se aquela mosca entrar de novo pela janela, jamais me casarei. se dentro de 3 minutos um moço de casaco azul não passar por mim, entrarei para o convento. se uma porta bater na hora do almoço, faço regime.
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Manoel fazia. Todo final de semana ia à rodoviária e sentava-se no terceiro banco da terceira fila da plataforma C, carregando consigo uma viola que nunca era tocada, juntamente com um pacote que era aberto e: olhado como quem garante, e novamente fechado como que assente.
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Dinah esteve. Andava sempre de salto-alto e meia-fina nas ruas de paralelepípedos, gostava de viver fortes emoções, e de ser socorrida por estranhos que demonstravam preocupação excessiva com os seus joelhos, e a meia rasgada no meio das pernas finíssimas de saracura.
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Alberto estava. Fazia a digestão do almoço dando 5 voltas no quarteirão de casa, acompanhado do vizinho que só aguentava 3 e ficava esperando no ponto de ônibus ao lado dos estudantes. Fazia a digestão do jantar dando voltas na praça próxima de casa, assoviando sempre o Bolero de Ravel e jogando alpiste às pombas e rolinhas.
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José é. Cego, mas insistia em dizer da feiúra das pessoas e da falta de gosto em combinar as cores e texturas. Casado com Telma, surda de nascença e consequentemente muda. O casal se comunicava através de Clóvis, mediador contratado, que sabia braille, linguagem de sinais e Esperanto.
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Sônia era-aí. Sofria de insônia e passava madrugadas inteiras costurando e descosturando retalhos numa colcha que só ficaria pronta quando mudasse de nome e se tornasse Neuza.
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Clara não era. Ela que sonhava com viagens de navio intercontinentais e viagens de avião interestaduais, nada fazia. Não era agente nem paciente, professora nem estudante, patroa nem proletária. Clara acaba de receber uma carta sem remetente, com recortes de jornal que diziam ser ela um "néant, uma qualquerzinha, tão inútil e desnecessária quanto uma fábula sem moral."

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