------- a coisa-em-mim -------

desaforismos. fábulas sem moral. egotrips. brainstorms.

terça-feira, junho 26, 2007



A Coisa-em-Si Bemol

sábado, junho 23, 2007

eu caio, ela cai, nós caímos.

Meu coração é um mendigo mais faminto da rua mais miserável.

Meu coração é um bordel gótico em cujos quartos prostituem-se ninfetas decaídas, cafetões sensuais, deusas lésbicas, anões tarados, michês baratos, centauros gays e virgens loucas de todos os sexos.

Meu coração é um anjo de pedra de asa quebrada.

Meu coração é um bar de uma única mesa, debruçado sobre a qual um único bêbado bebe um único copo de bourbon, contemplado por um único garçom. Ao fundo, Tom Waits geme um único verso arranhado. Rouco, louco.

Meu coração é um filme noir projetado num cinema de quinta categoria. A platéia joga pipoca na tela e vaia a história cheia de clichês.

Meu coração é o laboratório de um cientista louco varrido, criando sem parar Frankensteins monstruosos que sempre acabam destruindo tudo.

Meu coração é um ideograma desenhado a tinta lavável em papel de seda onde caiu uma gota d’água. Olhado assim, de cima, pode ser Wu Wang, a Inocência. Mas tão manchado que talvez seja Ming I, o Obscurecimento da Luz. Ou qualquer um, ou qualquer outro: indecifrável.Meu coração não tem forma, apenas som. Um noturno de Chopin (será o número 5?) em que Jim Morrison colocou uma letra falando em morte, desejo e desamparo, gravado por uma banda punk. Couro negro, prego e piano.

Meu coração é uma velha carpideira portuguesa, coberta de preto, cantando um fado lento e cheia de gemidos - ai de mim! ai, ai de mim!

Faquir involuntário, cascata de champanha, púrpura rosa do Cairo, sapato de sola furada, verso de Mário Quintana, vitrina vazia, navalha afiada, figo maduro, papel crepom, cão uivando pra lua, ruína, simulacro, varinha de incenso. Acesa, aceso - vasto, vivo:

Caio Fernando Abreu

sexta-feira, junho 22, 2007

mapa.

anda aqui, se perde lá, volta ali, retorna aqui, cai ali, levanta aqui, vira aí, espera aqui, se perde ali, encontra aqui, tropeça aí, levanta lá, sucumbe aqui, se acha ali, se prende ali, arrasta ali, caminha ali, acerta lá, erra aqui, termina aí, começa ali, morre lá, renasce aqui, se perde aqui, se acha aqui, se perde aí ------------------------------ se acha lá ----------- se perde aqui ---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- se acha ali, se -------

segunda-feira, junho 18, 2007

Respiração.

Inspiração

E esse cansaço todo de amanhecer é o medo de não encontrar e nunca mais ousar procurar, ou esquecer o caminho de volta, por falta de migalhas e rastros nesse caminho congelante(de neve), não podendo voltar pelos meus próprios passos. PERD-I-D-A.
Daí vou pra varanda no andar 17 e tragando o brilho e a vigília dos olhos das aves noturnas, sopro fantasmas e vermes pra bem longe, fora daqui. Minha bateria é recarregável, minhas alucinações não são facilmente mortalizadas, e meu ballet não se cansa de circular/circular/reciclar. No entanto fraquejo, já estou tonta, torta, peço que me segure, me balance contra o vento, chego à beira da sua nuca e digo já descontrolada:
Tenho segurado a onda com os pés, as mãos e os dentes. Rezei salmos nua na beirada da cama, me masturbei pra Jesus Cristo e ainda assim. Penso em cores, no desejo vermelho magma, numa voz veludo azul, o silêncio urge cinza, palavras renda lilás, a respiração branca de neve, a distância rude e negra.
Grito pr'as paredes de vidro e bato a porta: as agulhas embaixo das unhas já não fazem mais efeito. Preciso de uma roupa que me vista por dentro --- Salivo por todas as partes.

Expiração.

segunda-feira, junho 11, 2007

dos que param de brincar.

Aquele que está na berlinda, segurando-se num pedaço de nuvem que não se ampara em nada, uma nuvem prestes a se desmanchar no ar. Uma nuvem prestes a chover-se, transformar-se em água. Uns não crêem nas próprias asas de cera, que mesmo precárias, sustentam o corpo por entre as nuvens que insistentemente se condensam e se dissolvem. Uns não aceitam as asas de cera, e deliberadamente cortam-nas, se não lhes é permitido planar além das nuvens, se não lhes é permitido escapar à miséria de se sustentar no que é fugaz. E há também o Ícaro, aquele jovem confiante e idealista que finalmente subiu, mas que não suportou o Sol e a tão desejada altura. Por desejar tudo, não lhe sobrou nada. A altura sobrehumana queima. É perigoso desejar o Sol. O que é alto demais. O que é longe demais. Subir demais é perder-se, e quando se atinge o paroxismo de tal feito, é a ironia de retornar o próprio corpo àquilo do que antes se fugia: à terra tão baixa. Consciência não há mais. Por desejar tudo, sobrou-lhe o nada. Por querer o mundo que não cabe dentro de mim, nem de ti. E como saber ao certo a parte que me/te cabe, sem que a gente doa? Como não morrer com o mundo entalado na garganta? Como dosar a vontade de vida? Como saber do perigo do que eu estou vendo?

"Mas dedicar-me à visão do ovo seria morrer para a vida mundana, e eu preciso da gema e da clara."

segunda-feira, junho 04, 2007

samba canción dodecafônico II

eu vou gritar o silêncio torpe,
eu vou sim
nesses ouvidos tão
surdos que são os meus também
eu vou porque algo nos escapa
eu vou gritarrrrrrrrrrrrrrrr
- e vai gritar o quê?
.
é que falta compasso lucidez medida pra dizer
- e vai dizer o quê?
as tripas,
coração.
é tudo o que você tem.

as tripas que te confirmam na pista de dança
e se reviram etílicas dentro do corpo
o corpo implorando por mais cuidados
e o coração mais revirado que as entranhas!
.
oh, eu quero me desfazer das vísceras
eu queria ser uma abstração
gostar mais das abstrações

e desmaterializar sem dó.
o conceito de queda não cai na pista
não se derruba na vida,
não pombagira
não tem joelhos

nem sente dor.


laiá laiá laiá (7 x)